O calor invel na Capital Federal e a baixa umidade do ar me propiciaram uma noite mal dormida, sem descanso e sem a possibilidade de repor as energias para o dia seguinte de trabalho.
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Voltei a So Paulo onde a temperatura estava amena e a garoa levou-me a deslizar pela linha do tempo ao recordar-me da cidade que conheci, nos anos 60, que amanhecia coberta pela bruma misteriosa das alturas nesse planalto da Mata Atlntica.
Neste local, h 465 anos atrs, ocorreria o incio da histria de uma das mais pujantes, complexas e curiosas metrpoles do Planeta Terra.
Descansei todo o dia de sbado ao dar continuidade leitura de um livro com a biografia de Cndido Portinari.
Veio-me ento mente o desejo de ir ao Museu da Imigrao a fim de compreender, de forma mais ampla, a importncia do polo tnico-cultural desta desvairada metrpole que ainda caminha, aos tropeos, como uma grande cidade do terceiro mundo: a fiao eltrica no subterrnea, no h esgoto para cerca de 30% da populao carente nas zonas perifricas paulistanas e tampouco existem reas ou logradouros pblicos onde as pessoas possam usufruir do lazer comunitrio sem que tenham a sensao de que estaro assaltadas e que correro inclusive perigo de vida.
Impressionou-me o acervo existente no Museu da Imigrao e imaginei o quanto deve ter sido difcil para esses novos habitantes, aps cruzarem o oceano em condies precrias, ao chegar em uma nao onde nem sequer falavam o idioma.
Sai caminhando pelo bairro da Mooca e surpreendeu-me as fachadas das pequenas lojas que vendiam ora instrumentos musicais ora apetrechos para cristos catlicos que ainda fazem parte de uma leitura formal da presena da religio em suas vidas.
Decido ento ir para o centro velho de So Paulo e encontro sacos de lixos rasgados quando mendigos, busca de alimentar-se dos detritos espalhados pelas caladas, pareciam zumbis sem eira nem beira no triste cenrio. avam sorrateiramente carroas carregadas de papelo e papel a serem reciclados por valentes heris que contribuem de forma annima para a reutilizao de nobres matrias subestimadas e desperdiadas pelos afoitos paulistanos, grandes consumidores vorazes de ''qualquer coisa''.
Decido ento tomar uma cerveja em um pequeno bar de esquina onde a luz artificial extremamente forte me permitia ler com clareza as pginas do livro sobre a vida do importante e arrogante artista de Brodowski, que foi um dos mais renomados artistas brasileiros aps o movimento da fatdica e insossa semana de 22: Cndido Portinari.
Percebi que a noite despia o seu negro manto e que a tarde recolhia os sons dourados de um dia calorento do incio de vero brasileiro.
Veio-me ao esprito o desejo de recolher-me em paz no subsolo do local onde vivo e trabalho, que me permite estar alheio energia frentica causada pelos agitados habitantes da Capital Paulista.
No dia seguinte, na segunda-feira, tudo comearia de novo e, mais uma vez, o tempo deslizaria por minhas mos sem que percebesse com clarividncia a importncia do viver e o quo efmera a nossa agem por este planeta.
Mais um adeus a mais um domingo e mais uma semana no desenho anual de mais um ano de vida.