O Tribunal de Justia de So Paulo elevou para quinhentos mil reais o valor da indenizao por danos morais coletivos imposta Concessionria da Linha 4 do Metr de So Paulo (Via Quatro) por efetuar coleta, armazenamento e outros usos de dados pessoais dos usurios do metr, sem o consentimento destes (Apelao Cvel n 1090663-42.2018.8.26.0100). 5n4h5k
A empresa instalou um sistema de Portas Interativas Digitais em quatro estaes da linha amarela do metr de So Paulo, que faziam o registro das reaes emocionais dos usurios diante dos anncios exibidos, para fins publicitrios.
Segundo a Lei Geral de Proteo de Dados – LGPD (Lei n 13.709/2018), dado pessoal toda informao relacionada a uma pessoa natural identificada ou identificvel, de modo que a coleta, uso ou outro tratamento desta informao deve se fazer de acordo com as suas normas.
Em defesa no processo, a empresa alegou que os dados que coletava no se enquadram na definio legal de dados pessoais, porque as informaes recolhidas eram dados estatsticos, incapazes de identificar o seu titular. Afirmou a empresa:
“Trata-se da deteco, atravs de uma imagem, de caractersticas faciais totalmente desvinculadas identidade de uma pessoa, mediante a utilizao de algoritmos computacionais” (...) que geram “resultado de seu uso somente dados estatsticos, absolutamente incapazes de identificar o usurio”. (...) “a tecnologia embarcada nas Portas Interativas Digitais se limita a contar as pessoas, visualizaes, tempo de permanncia, tempo de ateno, gnero, faixas etrias, emoes, fator de viso, horas de pico de visualizaes e distncia de deteco, sem que para isso colete qualquer dado pessoal de pessoa individualizada. Apenas so gerados dados meramente estatsticos”.
Contudo, a identificabilidade do titular de uma informao no se confunde com a possibilidade de conhecimento da sua identidade em sentido estrito. A identificabilidade de uma pessoa, para o fim de proteo de seus dados pessoais, diz respeito possibilidade de sua distino, de sua singularizao em relao s demais. Se um dado permite que o indivduo seja distinguido dos demais, num determinado contexto, trata-se de dado pessoal.
O Regulamento Geral de Proteo de Dados da Unio Europeia dispe que uma pessoa pode ser identificada, dentre outros, por um ou mais elementos especficos da sua identidade fsica, fisiolgica, gentica, mental, econmica, cultural ou social. Entende-se que a combinao de detalhes de diferentes categorias pode ser muito conclusiva em determinadas circunstncias. Para se considerar uma pessoa identificvel, deve-se ter em conta o conjunto dos meios susceptveis de serem razoavelmente utilizados pelo agente de tratamento ou outra pessoa. Integram este “conjunto de meios” no somente o custo do processo de categorizao da pessoa, mas tambm o objetivo pretendido, o modo como o tratamento estruturado, a vantagem esperada pelo agente de tratamento (empresa).
Se o alcance da finalidade do tratamento dos dados precisar da singularizao do titular dos dados, estes dados so dados pessoais.
A empresa informou no processo que o sistema das Portas Interativas captava imagem e caractersticas faciais dos usurios, desvinculadas da respectiva identidade, alm de registrar o tempo de permanncia diante dos anncios, de ateno, o gnero, a faixa etria e as respectivas emoes, para fins publicitrios.
Tudo indica que os dados captados, embora pudessem no estar diretamente vinculados a uma identificao das pessoas em sentido estrito, eles permitiam que a empresa e seus parceiros anunciantes alcanassem individualmente os usurios do metr, a partir de suas caractersticas, com considervel probabilidade de os influenciar nas suas tomadas de deciso. Afinal, o registro de vrios aspectos da personalidade do indivduo, dos horrios em que ele a pelos anncios e das suas reaes emocionais diante destes anncios tem, por objetivo, formar um perfil psicolgico e direcionar a publicidade de modo a exercer sobre ele uma influncia, para lev-lo a uma deciso que beneficie economicamente o anunciante.
A autodeterminao informativa e o livre desenvolvimento da personalidade, constituem fundamentos do direito proteo de dados pessoais. Um dos objetivos da LGPD proteger o indivduo para que ele no tenha os seus dados usados, sem o seu conhecimento, com o fim de influenciar o seu pensamento e as suas aes.
O chamado IP dos computadores, por exemplo, um dado pessoal pelo fato de que, atravs dele, uma pessoa pode ser distinguida com base em alguns critrios, como socioeconmicos, filosficos ou outros e ser influenciada para determinadas decises. O estabelecimento do contato com ela no depende do conhecimento da sua identidade em sentido estrito.
Deste modo, se determinadas informaes permitirem que se chegue pessoa delas titular, pela sua categorizao num determinado contexto, tais informaes so dados pessoais, ainda que no se conhea a sua identidade em sentido estrito. Sendo dados pessoais, sujeitam-se s normas da LGPD.