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Coluna | Seu Direito
Dr. Luiz Cludio Borges
[email protected]
Mestre em Direito Constitucional e Democracia, pela FDSM, Especialista em Direito Civil e Processo Civil, G-FADIVA. Professor da Unilavras. Advogado
A Cobrana de Dvidas luz do Cdigo de Defesa do Consumidor
15/03/2012
Nesta edio, pretendemos apontar os limites impostos pelo legislador (criador da lei) ao fornecedor (credor) na cobrana de dvidas de consumidores inadimplentes. O tema no desafia maiores digresses, mas desperta o interesse, sobretudo daqueles consumidores que so hodiernamente desrespeitados nos seus direitos bsicos. Pensando nisso, resolvemos lanar trs perguntas, que ao longo do texto sero prontamente respondidas: i) como o fornecedor, sendo titular de um crdito, deve exercer o direito de cobrana? ii) o que se pode entender por cobrana abusiva? e iii) quais as implicaes dessa cobrana abusiva/indevida?

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Os estudiosos apontam que a preocupao com os direitos do consumidor teve incio aps a declarao do presidente John Kennedy ao Congresso norte-americano, em 1962, onde chamou a ateno do Congresso para a necessidade de proteo do consumidor e estabeleceu quatro direitos bsicos: a) direito segurana, b) direito informao, c) direito de escolha, e d) direito de ser ouvido(1) . Da em diante, inmeras leis comearam a ser editadas visando a proteo do consumidor.

No Brasil, a defesa do consumidor s se tornou efetiva aps a edio do Cdigo de Defesa do Consumidor, Lei 8078 de 11 de setembro de 1990(2) . O CDC(3) brasileiro, assim como todas as normas jurdicas que tutelam a defesa do consumidor, tem como princpio bsico a vulnerabilidade do consumidor(4) , o que significa que o consumidor a parte mais frgil da relao de consumo.

Partindo dessa premissa, o legislador estabeleceu como direito bsico do consumidor a proteo contra todas e quaisquer prticas abusivas (art. 6, inciso IV)(5) . E mais, apontou no artigo 39 do CDC(6) , algumas prticas abusivas, entretanto, aquelas no so as nicas, pois, alm delas existem outras, como o caso do artigo 42, que trata da cobrana abusiva de dvidas.

O limite imposto ao fornecedor (lojista, instituies financeiras, profissionais liberais etc) pode ser encontrado no artigo 42, do CDC, o qual prescreve que na cobrana de dbitos, o consumidor inadimplente no ser exposto a ridculo, nem ser submetido a qualquer tipo de constrangimento ou ameaa.

O artigo 71 do Cdigo de Defesa do Consumidor tambm prescreve que crime, punvel com deteno (priso) de trs meses a um ano e multa, utilizar, na cobrana de dvidas, de ameaa, coao, constrangimento fsico ou moral, afirmaes falsas, incorretas ou enganosas ou de qualquer outro procedimento que exponha o consumidor, injustificadamente, a ridculo ou interfira com seu trabalho, descanso ou lazer.

Seguem alguns exemplos:

I) Ameaar o devedor de que vai denunci-lo a amigos; de contar para o marido ou a exposta etc (ameaar que vai acion-lo judicialmente ou negativ-lo no existe nenhum impedimento;

II) Coagir o devedor a praticar um ato contra sua vontade (ex. Coagir o consumidor a deixar um cheque cauo ou uma promissria, sob pena de no poder internar ou sair do hospital);

III)Expor o consumidor inadimplente a riscos a sua sade ou integridade fsica, bem como de seus familiares, e/ou lhes causarem dor (aspecto moral). (ex. Ameaa e corte de gua ou energia eltrica, caso o pagamento no seja realizado);

IV) Utilizar-se de afirmaes falsas, incorretas e enganosas (leia-se como sinnimos). (ex. Cobrador da empresa que liga para o consumidor inadimplente e alega que oficial de justia ou advogado. outro ex. Rear ao devedor um valor de dvida bem superior ao real, a fim de obter uma negociao melhor);

V) Expor o consumidor o ridculo. (ex.: o credor tem o direito de inserir no banco de dados informaes negativas do devedor, mas no poder deixar a exposio um cheque devolvido sem fundos, no sentido de expor s pessoas que aquele cidado mau pagador. Outro ex.: enviar ao devedor um envelope contendo na parte de fora a expresso (em letras garrafais) cobrana;

VI) Jamais ligar para o emprego do devedor e deixar recados com terceiros. (no existe nenhum impedimento do credor entrar em contato com o devedor no seu emprego, desde que a comunicao (ou cobrana) seja com o prprio devedor).

importante esclarecer que o fornecedor tem todo direito de cobrar o consumidor inadimplente, entretanto, dever faz-lo com critrio, sem violar os direitos do consumidor, pois ao violar esses direitos estar sujeito s penas impostas pelo prprio CDC, assim como poder responder por danos materiais ou morais.

O fornecedor que se utilizar de mtodos idneos de cobrana nada mais faz do que exercer regularmente seu direito como credor, mas, se ao contrrio i) ameaar o consumidor devedor, ii) o expor a ridculo, iii) o coagir, iv) o expor a perigo ou v) se utilizar de afirmaes falsas estar incidindo na prtica abusiva prevista no artigo 42 do CDC.

Como implicaes ou conseqncias dessa prtica abusiva, o fornecedor poder ser condenado a uma pena de deteno (priso) de trs meses a um ano e multa. No pra por a. O consumidor poder ingressar com uma ao judicial, onde, uma vez demonstrada a existncia de danos materiais ou morais, o fornecedor poder ser condenado a pagar uma indenizao. (7)

O consumidor prejudicado pode e deve buscar seus direitos, ou seja, i) poder contratar um advogado, outorgando-lhes poderes para ingressar com uma ao na Justia Comum ou no Juizado Especial Cvel, exigindo que o fornecedor se abstenha de cometer tais prticas abusivas, bem como seja condenado ao pagamento de uma indenizao, seja por danos materiais ou morais; ii) poder ingressar com a mesma ao, sem a assistncia de advogado (se o valor for inferior a 20 salrios mnimos), bastando apenas procurar o setor de atermao do Juizado Especial; iii) poder procurar o PROCON da sua cidade e pedir providncias istrativas; e, por fim, iv) poder acionar o Ministrio Pblico (Promotor de Justia) solicitando-lhe providncias na esfera criminal.

Podemos concluir que a cobrana de dvida um direito do fornecedor como credor, entretanto, este dever se utilizar de critrios que apontamos como idneos, sob pena de violar os direitos do consumidor. Violados tais direitos, o fornecedor fica sujeito s implicaes do Cdigo de Defesa do Consumidor, como a condenao a uma pena de priso, bem como a uma pena pecuniria (em dinheiro) por danos morais e materiais.

1 - Miragem, Bruno Curso de direito do consumidor 2. ed. rev., atual. e ampl.- ampl. So Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2010, pg. 28.

2 - importante salientar que o Cdigo de Defesa do Consumidor brasileiro nasceu de uma ordem constitucional por fora de uma ordem constitucional [art. 5, inciso XXXII, art. 170, inciso V, da Constituio Federal e artigo 48, dos Atos das Disposies Constitucionais Transitrias].

3 - Cdigo de Defesa do Consumidor.

4 - curioso notar que o consumidor vulnervel em diversos aspectos. Sobre o tema o professor Bruno Miragem discorre que

[a] doutrina e a jurisprudncia vm distinguindo diversas espcies de vulnerabilidade. Entre ns, conhecida a lio de Cludia Lima Marques que distinguiu a vulnerabilidade em trs grandes espcies: vulnerabilidade tcnica; vulnerabilidade jurdica; e vulnerabilidade ftica. E recentemente, identifica a autora gacha uma quarta espcie de vulnerabilidade, a vulnerabilidade informacional.

A vulnerabilidade tcnica do consumidor se d em face da hipostese na qual o consumidor no possui conhecimentos especializados sobre o produto ou servio que adquire ou utiliza em determinada relao de consumo.

[...]. O que determina a vulnerabilidade, neste caso, a falta do conhecimentos especficos pelo consumidor [...].

[...].

A vulnerabilidade jurdica, a nosso ver, se d na hiptese da falta de conhecimento, pelo consumidor, dos direitos deveres inerentes relao de consumdo que estabelece, assim como a ausncia da compreenso sobre as consequncias jurdicas dos contratos que celebra.

[...].

A vulnerabilidade ftica espcie ampla, que abrange, genericamente, diversas situaes concretas de reconhecimento da debilidade do consumidor. A mais comum, neste caso, a vulnerabilidade econmica do consumidor em relao ao fonecedor. No caso, a fraqueza do consumidor situa-se justamente na falta dos mesmos meios ou do mesmo porte econmico do consumidor.[...].

5 - Art. 6 So direitos bsicos do consumidor:

I - a proteo da vida, sade e segurana contra os riscos provocados por prticas no fornecimento de produtos e servios considerados perigosos ou nocivos;

II - a educao e divulgao sobre o consumo adequado dos produtos e servios, asseguradas a liberdade de escolha e a igualdade nas contrataes;

III - a informao adequada e clara sobre os diferentes produtos e servios, com especificao correta de quantidade, caractersticas, composio, qualidade e preo, bem como sobre os riscos que apresentem;

IV - a proteo contra a publicidade enganosa e abusiva, mtodos comerciais coercitivos ou desleais, bem como contra prticas e clusulas abusivas ou impostas no fornecimento de produtos e servios;

V - a modificao das clusulas contratuais que estabeleam prestaes desproporcionais ou sua reviso em razo de fatos supervenientes que as tornem excessivamente onerosas;

VI - a efetiva preveno e reparao de danos patrimoniais e morais, individuais, coletivos e difusos;

VII - o o aos rgos judicirios e istrativos com vistas preveno ou reparao de danos patrimoniais e morais, individuais, coletivos ou difusos, assegurada a proteo Jurdica, istrativa e tcnica aos necessitados;

VIII - a facilitao da defesa de seus direitos, inclusive com a inverso do nus da prova, a seu favor, no processo civil, quando, a critrio do juiz, for verossmil a alegao ou quando for ele hipossuficiente, segundo as regras ordinrias de experincias;

IX - (Vetado);

X - a adequada e eficaz prestao dos servios pblicos em geral.

6 - Art. 39. vedado ao fornecedor de produtos ou servios, dentre outras prticas abusivas: (Redao dada pela Lei n 8.884, de 11.6.1994)

I - condicionar o fornecimento de produto ou de servio ao fornecimento de outro produto ou servio, bem como, sem justa causa, a limites quantitativos;

II - recusar atendimento s demandas dos consumidores, na exata medida de suas disponibilidades de estoque, e, ainda, de conformidade com os usos e costumes;

III - enviar ou entregar ao consumidor, sem solicitao prvia, qualquer produto, ou fornecer qualquer servio;

IV - prevalecer-se da fraqueza ou ignorncia do consumidor, tendo em vista sua idade, sade, conhecimento ou condio social, para impingir-lhe seus produtos ou servios;

V - exigir do consumidor vantagem manifestamente excessiva;

VI - executar servios sem a prvia elaborao de oramento e autorizao expressa do consumidor, ressalvadas as decorrentes de prticas anteriores entre as partes;

VII - rear informao depreciativa, referente a ato praticado pelo consumidor no exerccio de seus direitos;

VIII - colocar, no mercado de consumo, qualquer produto ou servio em desacordo com as normas expedidas pelos rgos oficiais competentes ou, se normas especficas no existirem, pela Associao Brasileira de Normas Tcnicas ou outra entidade credenciada pelo Conselho Nacional de Metrologia, Normalizao e Qualidade Industrial (Conmetro);

IX - deixar de estipular prazo para o cumprimento de sua obrigao ou deixar a fixao de seu termo inicial a seu exclusivo critrio;

IX - recusar a venda de bens ou a prestao de servios, diretamente a quem se disponha a adquiri-los mediante pronto pagamento, ressalvados os casos de intermediao regulados em leis especiais; (Redao dada pela Lei n 8.884, de 11.6.1994)

X - (Vetado).

X - elevar sem justa causa o preo de produtos ou servios. (Includo pela Lei n 8.884, de 11.6.1994)

XI - Dispositivo includo pela MPV n 1.890-67, de 22.10.1999, transformado em inciso XIII, quando da convero na Lei n 9.870, de 23.11.1999

XII - deixar de estipular prazo para o cumprimento de sua obrigao ou deixar a fixao de seu termo inicial a seu exclusivo critrio.(Includo pela Lei n 9.008, de 21.3.1995)

XIII - aplicar frmula ou ndice de reajuste diverso do legal ou contratualmente estabelecido. (Includo pela Lei n 9.870, de 23.11.1999)

Pargrafo nico. Os servios prestados e os produtos remetidos ou entregues ao consumidor, na hiptese prevista no inciso III, equiparam-se s amostras grtis, inexistindo obrigao de pagamento.

7 - 93170593 - APELAO CVEL. RESPONSABILIDADE CIVIL. COBRANA VEXATRIA DE DVIDA. ABUSO DE DIREITO. DANO MORAL. QUANTUM INDENIZATRIO. CRITRIOS. MANUTENO. JUROS DE MORA. TERMO INICIAL. DATA DO ARBITRAMENTO DA INDENIZAO. A cobrana vexatria de dvida, com a exposio do devedor em situao constrangedora em seu local de trabalho, fato bastante para caracterizar dano moral. Hiptese em que a prova dos autos revela que a parte autora restou submetida a cobrana de forma vexatria por preposto da parte requerida. Abuso no exerccio do direito. Art. 187 do CC. Dano moral verificado. Valor da condenao (R$ 5.500,00) mantido, eis que fixado de acordo com as peculiaridades do caso concreto, alm de observados os princpios da proporcionalidade e razoabilidade e a natureza jurdica da condenao. Em se tratando a espcie de reparao por danos morais, o termo inicial para fluncia dos juros se d a partir da fixao do quantum indenizatrio, dizer, a contar do julgamento no qual foi arbitrado o valor da condenao, no caso, a data da sentena. Apelo parcialmente provido. Unnime. (TJRS; AC 618175-03.2011.8.21.7000; Caxias do Sul; Nona Cmara Cvel; Rel. Des. Tasso Caubi Soares Delabary; Julg. 29/02/2012; DJERS 05/03/2012)

48411130 - JUIZADO ESPECIAL. CONSUMIDOR. COBRANA DE DVIDA NO LOCAL DE TRABALHO DE FORMA VEXATRIA. VIOLAO A ATRIBUTO DA PERSONALIDADE. DANO MORAL CONFIGURADO. OBSERVNCIA AOS PRINCPIOS DA RAZOABILIDADE E DA PROPORCIONALIDADE. RECURSO DO AUTOR DESERTO. PREPARO IRREGULAR (PAR. NICO ART. 54). PRESSUPOSTO OBJETIVO DE ISSIBILIDADE. NEGADO SEGUIMENTO NO JUZO DE ISSIBILIDADE. PRECLUSO. CONHECIDO O RECURSO DO RU E NO PROVIDO. 1. A relao entre as partes consumerista. O recorrente presta servio de cobrana, logo tem responsabilidade objetiva por qualquer dano causado ao consumidor, conforme disposto no artigo 14 do CDC. 2. O art. 42 da Lei n. 8.078/90 estabelece que na cobrana de dbitos, o consumidor inadimplente no ser exposto a ridculo, nem ser submetido a qualquer tipo de constrangimento. Restou incontroverso que o credor por si, ou atravs de terceiros, efetuou inmeras ligaes telefnicas para o local de trabalho do devedor, por isso, evidente a violao da dignidade do consumidor, se o fornecedor o expe situao vexatria. 3. Na fixao da indenizao por danos morais, deve-se atentar para os critrios da razoabilidade e da proporcionalidade, observados os fins pedaggicos e compensatrios da indenizao. No se mostram excessivos os r$1.000,00 (mil reais) arbitrados, considerada a capacidade econmica do responsvel civil. 4. A parte que desejar recorrer dever recolher o valor do preparo na forma do pargrafo nico do art. 54 da Lei n. 9.099/95, ou seja, as custas pela tramitao em primeiro grau, alm do porte de remessa e retorno dos autos da segunda instncia. No h embasamento legal, para considerar satisfeita a exigncia legal, o pagamento das custas iniciais pela parte adversa, que tambm recorreu, e a pretexto que bastaria o recolhimento do porte de remessa e retorno dos autos. Tal entendimento malfere no s o princpio da isonomia processual, como implicaria em locupletamento ilegtimo. Negado seguimento ao recurso no juzo de issibilidade e preclusa a deciso, descabe qualquer juzo de valor sobre a irresignao. 5. Recurso do banco HSBC conhecido e no provido. (TJDF; Rec 2009.01.1.167033-5; Ac. 566.732; Segunda Turma Recursal dos Juizados Especiais do Distrito Federal; Rel. Juiz Luis Gustavo B. de Oliveira; DJDFTE 29/02/2012; Pg. 271)

95341266 - Dano moral Cobrana vexatria de dvida diante do estabelecimento da autora pessoa jurdica Leso idoneidade da empresa autora que se presume. Dano moral configurado Indenizao fixada com moderao, em face da peculiaridade dos fatos Recurso, em parte, provido e prejudicado o adesivo. (TJSP; APL 9081569-26.2007.8.26.0000; Ac. 5674220; Botucatu; Vigsima Cmara de Direito Privado; Rel. Des. Cunha Garcia; Julg. 30/01/2012; DJESP 29/02/2012)

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