22a44
Cumpre-nos, antes de tratarmos do tema proposto, trazer os conceitos de produto e servio. O CDC no seu artigo 3, 1 e 2, diz que produto qualquer bem, mvel ou imvel, material ou imaterial; j servio, qualquer atividade fornecida no mercado de consumo, mediante remunerao, inclusive as de natureza bancria, financeira, de crdito e securitria, salvo as decorrentes das relaes de carter trabalhista.
Observa-se o conceito de produto muito amplo, alcana todo e qualquer produto colocado no mercado de consumo. Quanto aos servios, existe uma peculiaridade. S pode ser considerado servio aquele realizado mediante remunerao, que so pagos e no gratuito, como por exemplo: a) os servios de hospedagem, b) os servios de transporte, c) os servios de educao, d) entretenimento etc.
Mas, haver situaes onde os servios no so pagos diretamente, como acontece com os estacionamentos em supermercados, farmcias e Shopping Center. Neste caso, ainda que o consumidor no pague diretamente pelo servio, este remunerado indiretamente, na medida em que o consumidor consome os produtos.
Pois bem, definidos os conceitos de produto e servio, emos ento a discutir quando esse produto ou servio est viciado ou com defeito. Ser que essas expresses (defeito e vcio) so sinnimas ou tm significados distintos.
O Cdigo de Defesa do Consumidor (CDC), ao tratar da responsabilidade civil do fornecedor, cria duas hipteses de aplicao, a primeira denominada de responsabilidade pelo fato do produto (artigos 12-14) e a segunda de responsabilidade pelo vicio do produto (artigos 18-20).
preciso esclarecer que responsabilidade civil a obrigao que uma das partes tem de reparar os danos por ela provocados, sejam morais ou materiais, decorrentes da prtica de atos ilcitos, ou seja, da ao ou omisso voluntria, imprudncia ou negligncia que causa dano a algum. Em suma, toda vez que algum, agindo ilicitamente, causar dano a outrem fica obrigado a repar-lo.
Quando o CDC fala em fato do produto, dizendo que o fabricante, o produtor, o construtor, nacional ou estrangeiro, e o importador respondem, independentemente da existncia de culpa, pela reparao dos danos causados aos consumidores por defeitos de correntes de projeto, fabricao, construo, montagem, frmulas, manipulao, apresentao ou acondicionamentos de seus produtos, bem como por informaes insuficientes ou inadequadas sobre sua utilizao e riscos (art. 12), ele est fazendo referncia ao chamado acidente de consumo.
O mesmo acontece em relao ao fato do servio, pois o fornecedor de servios responde, independentemente da existncia de culpa, para reparao dos danos causados aos consumidores por defeitos relativos prestao dos servios, bem como por informaes insuficientes ou inadequadas sobre sua fruio e riscos (art. 14).
O que acidente de consumo?
O dano causado ao consumidor em razo de um defeito no produto ou no servio. Produto ou servio defeituoso aquele que no oferece a segurana que dele se espera.
Como exemplo de acidente de consumo, podemos citar aquele do carro zero quilometro que sai da concessionria e que, no primeiro semforo no consegue parar causando um grave acidente, gerando danos no s patrimoniais, como tambm vida de outros condutores e pedestres.
Observa-se que no exemplo acima, uma falha nos freios do veculo (defeito no produto) causou um dano no apenas ao consumidor proprietrio do veculo, mas a outras pessoas, pedestres e condutores de veculos. o tpico acidente de consumo. Neste caso, o fabricante do veculo ser obrigado a reparar todos os danos causados ao consumidor e aos envolvidos.
Como exemplo de defeito (acidente de consumo) no servio prestado, podemos citar o acidente ocorrido com o avio da TAM, onde inmeras pessoas morreram (ageiros e proprietrios dos imveis onde o avio caiu. Alm das mortes o acidente causou danos materiais, com a destruio de diversos imveis.
Nos dois exemplos envolvendo acidente de consumo por defeito no produto ou no servio, os consumidores e as demais vtimas foram indenizados, ou seja, no primeiro caso a fabricante do veculo teve de indenizar o consumidor e todos os demais envolvidos, e, no segundo caso, a TAM teve que reparar os danos provocados aos ageiros (consumidores) e as vtimas.
E vcio, o que vcio?
Vcio um defeito que no causa dano. O vcio est intimamente ligado qualidade ou quantidade do produto, tornando-o imprprio ou inadequado ao consumo ou diminuindo-lhe o valor (art. 18). O vcio do servio se restringe qualidade do servio, que o torne imprprio ao consumo ou lhe diminua o valor (art. 20).
Os exemplos de vcio do produto so variados, como: a) a TV que no funciona, b) o liquidificador sem motor, b) o celular que no obedece aos comandos da tela, d) o refrigerante sem gs, e) o carro zero arranhado, f) o produto alimentcio com data de validade expirada (vencido), e) os enlatados amassados etc.
Como exemplo de vcio no servio, temos: a) a venda de agem area acima do nmero de agens disponveis, c) o caixa eletrnico que no libera o dinheiro sacado, c) o atraso no vo, d) o filme que era em cores, mas s a em preto e branco, e) o servio de hotel que no funciona como contratado, etc.
Observa-se que, em todos esses exemplos, seja em vcio do produto ou servio, o defeito no produto no causa danos ao consumidor, apenas torna o produto ou servio imprprio para o consumo ou lhe diminua o valor.
Portanto, primeira vista, defeito e vcio podem expressar a mesma coisa, entretanto, no so. Nas palavras do Rizzato Nunes, h vcio sem defeito, mas no h defeito sem vcio; o defeito pressupe o vcio. O defeito o vcio acrescido de um problema extra, alguma coisa extrnseca ao produto ou ao servio, que causa um dano maior que simplesmente, o mau funcionamento ou no funcionamento.(2).
Neste estudo fizemos uma abordagem sucinta dos institutos previstos nos artigos 12-14 e 18-20, defeito e vcio, respectivamente, apontando suas principais caractersticas e aplicaes prticas. evidente que no tivemos a pretenso de esgotar o assunto, at porque o espao no acadmico, entretanto, tentamos expressar um pouco do pensamento do legislador. Nos prximos textos iremos abordar como o consumidor pode exercer seu direito e exigir a responsabilidade civil do fornecedor.
1 - Pode soar estranho dizer isto, mas em pleno sculo XXI existem pessoas que sequer sabem da existncia do CDC, razo pela qual a insero da disciplina no ensino fundamental medida imprescindvel para a formao de consumidores conscientes.
O dever de informar sobre os direitos e deveres dos consumidores e dos fornecedores do Estado. Neste ponto, o Estado falha, sobretudo ao relegar esta obrigao iniciativa privada. J se aram 20 anos, desde a entrada em vigor do CDC, muito se fez, mas, ainda, existe muito a se fazer, sobretudo quando o assunto a difuso do CDC.
Sem uma educao adequada, pouco provavelmente o consumidor estar preparado para interpretar as normas elencadas no CDC. Se os prprios aplicadores e operadores do direito confundem os institutos existentes no Cdigo, quem dir o consumidor que leigo.
Um exemplo disso o disposto no artigo 12[viii] e 18[ix], do CDC. O primeiro trata da responsabilidade civil pelos danos causados aos consumidores por defeitos nos produtos; o segundo prev a responsabilizao dos fornecedores pelos vcios de qualidade ou quantidade. Ora, defeito e vcio no tm o mesmo significado?
Na linguagem utilizada pelo CDC no. So expresses parecidas, mas com significados diametralmente opostos. O consumidor est preparado para distinguir um instituto do outro? evidente que no. [...]. BORGES, Luiz Cludio. Direito do consumidor: Os efeitos pragmticos da Lei n 12.291/2010 que obriga a sociedade empresria e o prestador de servios a ter um exemplar do CDC disposio do consumidor. In: mbito Jurdico, Rio Grande, 95, 01/12/2011 [Internet]. Disponvel em http://www.ambito-juridico.com.br/site/index.php?n_link=revista_artigos_leitura&artigo_id=10876. o em 02/05/2012.
2 - Nunes, Luiz Antnio Rizzatto. Comentrios aos Cdigo de Defesa do Consumidor. Rio de Janeiro. Saraiva, 2000, p. 214.
Siga o Varginha Online no Facebook, Twitter
Varginha Online - 2000-2024